Esportes

Desembargadora atribui ao Vasco atraso em perícia para liberar São Januário


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Jogadores do Vasco participam de campanha para liberar São Januário — Foto: Roberto Rosendo / CRVG

Em julgamento na tarde da última quarta-feira, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) manteve a proibição de público em São Januário. Por dois votos a um, o estádio segue com portões fechados, com a permissão de funcionar para receber jogos sem torcida. O Vasco vai recorrer da decisão no Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília.

No acórdão – a decisão em colegiado publicada após o julgamento -, a desembargadora e relatora do recurso em segunda instância do Vasco colocou as razões pelas quais manteve o estádio inaugurado em 1927 fechado para receber torcedores vascaínos.

Jogadores do Vasco participam de campanha para liberar São Januário — Foto: Roberto Rosendo / CRVG

Citou até mesmo caso anterior ao jogo contra o Goiás de 22 de junho, quando se referiu ao vandalismo praticado por alguns “torcedores” – termo colocado entre aspas pela própria relatora do voto – após o clássico contra o Flamengo no Maracanã, com vitória rubro-negra por 4 a 1. O jogo foi realizado no início do mês de junho.

“E, tal conjuntura se revela ainda mais evidente quando rememoramos o ocorrido no último dia 05 de junho, quando, após uma derrota do Vasco da Gama para o time do Flamengo, no estádio do Maracanã, um grupo de ditos “torcedores” se dirigiu à São Januário e lá promoveu mais atos de vandalismo e desordem, expondo a desnecessário risco um número considerável de pessoas.

Logo, a conclusão a que se chega, ao menos enquanto não realizada a perícia técnica determinada pelo juízo originário, é que as medidas de segurança implementadas pelo clube agravante não tem logrado o mínimo êxito em evitar o acontecimento de cenas de confusão generalizada e depredação de patrimônios, dentro e fora do estádio de São Januário, por parte daqueles que frequentam o estabelecimento esportivo e se intitulam como “torcedores”, diz um trecho do voto da relatora.

A desembargadora também atribuiu ao próprio Vasco o atraso na realização da perícia, ainda sem data para ser realizada. O que depende também da aceitação dos termos do pedido da perita indicada – o ge revelou que os honorários pedidos são de quase R$ 1,4 milhão.

“…fato é que a perícia técnica determinada pelo juízo de origem na decisão agravada ainda não foi realizada, tendo a expert nomeada apresentado seus honorários em 22.08.2023, uma vez que, somente em 31.07.2023, o aqui agravante cumpriu com o comando judicial e apresentou os quesitos a serem respondidos/esclarecidos pela profissional designada.

Assim, observa-se que a justificada demora na confecção do laudo pericial decorre inexoravelmente do atuar do ora recorrente na 1ª instância, porquanto, conforme se colhe da simples leitura do decisum objurgado, o prazo determinado pelo juízo para sua entrega somente seria deflagrado com a apresentação dos quesitos pelos litigantes, o que, como visto, ocorrera há menos de 30 dias”, relata a desembargadora Renata Cotta.

A magistrada ainda lembra que o Vasco não apresentou “nenhuma prova” de prejuízo financeiro e cancelmento de sócios torcedores por não poder atuar no seu estádio e, como parte da conclusão das 24 páginas do acórdão, diz que “não há como se entender, ao menos neste momento processual, que o clube agravante tem cumprido adequadamente com sua obrigação legal de fornecer a segurança necessária e adequada aos eventos naquele estabelecimento promovidos“.

Veja a íntegra do voto no acórdão

“V O T O

Trata-se de agravo de instrumento interposto por Vasco da Gama Sociedade Anônima do Futebol contra decisão que, em ação civil pública, deferiu o pedido de tutela provisória de urgência, nos seguintes termos:

“A presente lide trata de pleito do Ministério Público fundado na necessidade de garantia de segurança dos torcedores e participantes de eventos esportivos realizados no Estádio de São Januário, destacando que, na data de ontem 22/06/2023, verificou-se a ocorrência de atos generalizados de violência no interior e no exterior do estádio, o que colocou em risco torcedores e participantes do evento esportivo.

De início, primordial esclarecer que a concessão da tutela provisória de urgência de natureza antecipada requer a demonstração dos requisitos instituídos no artigo 300 do Código de Processo Civil, quais sejam, a probabilidade de existência do direito material afirmado pelo demandante (artigo 300, caput, CPC); o perigo de dano (artigo 300, caput, CPC); e a reversibilidade dos efeitos práticos produzidos pela decisão concessiva da tutela provisória de urgência antecipada (artigo 300, § 3º, CPC). E, analisando os autos, observo que presentes os requisitos para concessão da medida. Preliminarmente, importante destacar que a segurança é prevista como Princípio Fundamental do Esporte pelo artigo 2º, XVI, Lei Geral do Esporte (Lei nº 14.597/2023):

Art. 2º São princípios fundamentais do esporte:

XVI – segurança. Ademais, o legislador atento à relevância da segurança no âmbito das competições esportivas tratou, de forma detalhada e específica, sobre o tema na

Subseção II da Seção II do Capítulo IV da Lei nº 14.597/2023: Subseção II.

Da Segurança nas Arenas Esportivas e do Transporte Público.

Art. 146. O espectador tem direito a segurança nos locais onde são realizados os eventos esportivos antes, durante e após a realização das provas ou partidas. Parágrafo único. Deve ser assegurada acessibilidade ao espectador com deficiência ou com mobilidade reduzida. Ressalte-se, ainda, quanto à previsão legal no sentido de ser o clube demandado, mandante da partida em questão, o responsável pela segurança do evento próximo passado e dos futuros, conforme artigo 149 da Lei Geral do Esporte, devendo atuar, ancorado também no Princípio da Responsabilidade Social de seus Dirigentes (artigo 2º, parágrafo único, III, do mesmo diploma legal), de forma a evitar ou solucionar anormalidades que impeçam o ingresso, a permanência e a saída do torcedor em segurança na partida.

In verbis:

Art. 149. Sem prejuízo do disposto nos arts. 12, 13 e 14 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), a responsabilidade pela segurança do espectador em evento esportivo será da organização esportiva diretamente responsável pela realização do evento esportivo e de seus dirigentes, que deverão:

I – solicitar ao poder público competente a presença de agentes públicos de segurança, devidamente identificados, responsáveis pela segurança dos espectadores dentro e fora dos estádios e dos demais locais de realização de eventos esportivos;

II – informar imediatamente após a decisão acerca da realização da partida, entre outros, aos órgãos públicos de segurança, de transporte e de higiene os dados necessários à segurança do evento, especialmente:

a) o local; b) o horário de abertura da arena esportiva; c) a capacidade de público da arena esportiva; d) a expectativa de público;

III – colocar à disposição do espectador orientadores e serviço de atendimento para que ele encaminhe suas reclamações no momento do evento, em local:

a) amplamente divulgado e de fácil acesso, especialmente pela internet; e b) situado na arena;

IV – disponibilizar 1 (um) médico e 2 (dois) profissionais de enfermagem, devidamente registrados nos respectivos conselhos profissionais, para cada 10.000 (dez mil) torcedores presentes ao evento;

V – comunicar previamente à autoridade de saúde a realização do evento.

§ 1º O detentor do direito de arena ou similar deverá disponibilizar 1 (uma) ambulância para cada 10.000 (dez mil) torcedores presentes ao evento. § 2º A organização esportiva diretamente responsável pela promoção do evento deverá solucionar imediatamente, sempre que possível, as reclamações dirigidas ao serviço de atendimento referido no inciso III do caput deste artigo, bem como reportá-las ao ouvidor da competição, e, nos casos relacionados à violação de direitos e interesses de consumidores, aos órgãos de proteção e defesa do consumidor.

Pois bem. Em exame superficial, examinando-se os elementos probatórios, em especial as imagens constantes nos links, abaixo destacados, mostra-se adequada e razoável o acolhimento da pretensão liminar do Ministério Público de interdição do Estácio de São Januário até que reste evidenciado que tal arena esportiva reúne as condições necessárias para sediar eventos esportivos:

Ora, as informações constante, nos autos, revelam de forma cristalina que, na data de ontem 22/06/2023, torcedores e demais participantes do evento tiveram o seu direito à segurança flagrantemente violado pela inicial atuação criminosa de um grupo de indivíduos e posterior ausência de estrutura física mínima e de preparação dos funcionários do clube réu em executar o plano de ação e de contingência que garantissem a pronta retirada dos torcedores daquele cenário de guerra instalado no interior e exterior da arena esportiva. Ademais, ainda que se possa afastar qualquer ligação entre as pessoas que iniciaram os atos de violência e o clube réu, há de se buscar, neste momento, resguardar a segurança dos torcedores, com a interdição temporária do Estádio de São Januário até que se comprove a existência de condições de segurança com a apresentação de laudos técnicos atualizados dos órgãos estatais responsáveis, especialmente diante dos danos causados no local.

Ademais, evidente a presença de efetivo perigo de dano aos frequentadores do Estádio de São Januário no caso de nova ocorrência de situação como a experimentada na partida de ontem (22/06/2023), episódio que, sabidamente, afasta-se do caráter de excepcionalidade.

Ressalte-se, também, quanto à reversibilidade da presente medida, já que, evidenciadas as condições de segurança para recebimento de eventos, imediatamente restará afastada a presente medida de interdição. Noutro ponto, importante destacar acerca da necessidade de apresentação, não só dos laudos técnicos expedidos por órgãos públicos das condições de segurança das arenas esportivas (artigo 147 da Lei Geral do Esporte), mas também de planos de ação referentes à segurança, transporte e contingências. Observe o artigo 151 da referida lei:

Art. 151. É direito do espectador a implementação de planos de ação referentes a segurança, a transporte e a contingências durante a realização de eventos esportivos com público superior a 20.000 (vinte mil) pessoas.

§1º Os planos de ação de que trata o caput deste artigo serão elaborados pela organização esportiva responsável pela realização da competição, com a participação das organizações esportivas que a disputarão e dos órgãos das localidades em que se realizarão as partidas da competição responsáveis pela segurança pública, pelo transporte e por eventuais contingências.

§2º Planos de ação especiais poderão ser apresentados em relação a eventos esportivos com excepcional expectativa de público.

§3º Os planos de ação serão divulgados no sítio eletrônico dedicado à competição, no mesmo prazo de publicação de seu regulamento definitivo. Nesse passo, além dos laudos técnicos de praxe expedidos pelos órgãos públicos, mostra-se adequada a realização, em caráter de urgência, de Prova Técnica, também, por Perito do Juízo, o que determino com base no artigo 297 do Código de Processo Civil, a fim de se reforçar a avaliação das condições de segurança da referida arena esportiva para receber eventos esportivos e dos planos de ação e contingência, mormente em razão dos eventos narrada na peça inicial e dos danos causados na data de ontem 22/06/2023.

Nomeio, assim, a expert ELEONORA GASPAR SCARTON, Engenheira Civil, CREA-RJ 42362D. Portanto, considerado o último episódio ocorrido no Estádio de São Januário, verifica-se, ao menos em cognição sumária, que a arena esportiva não dispõe de condições mínimas para a realização de partidas de futebol. Por todo o exposto, verificada a probabilidade do direito invocado e o perigo de dano, de modo que, nos termos do artigo 300 do Código de Processo Civil, DEFIRO a tutela provisória para decretar a interdição do Estádio de São Januário até que reste comprovada a presença das condições necessárias para sediar os eventos esportivos por meio de laudos técnicos atualizados dos órgãos estatais e do Perito do Juízo. Nomeio a expert ELEONORA GASPAR SCARTON, Engenheira Civil, CREA-RJ 42362D.

Intime- se a perita, no e-mail cadastrado, para dizer se aceita o encargo e atender ao disposto no artigo 465, §1º, Código de Processo Civil, no prazo de cinco dias. Os honorários periciais serão pagos ao final da ação, nos termos do artigo 18 da Lei 7.347/1985.

Diante da urgência da medida, fixo prazo de até 30 (trinta) dias para elaboração do laudo técnico a contar da data de apresentação dos quesitos pelas partes. Intime-se as partes para, no prazo de cinco dias, apresentarem os quesitos.

Oficie-se comunicando a presente a suspensão ao GEPE, à FFERJ, à CBF e ao Club de Regatas Vasco da Gama. Intime-se e cite-se o clube réu.” (Fls. 40/46)

Em seu recurso, protocolado em sede de plantão judiciário, o clube agravante defende que:

(i)teria todos os laudos exigidos pela legislação mais recente, atualizados; (ii)(ii) teria sido proativo e tomado todas as medidas de segurança cabíveis, inclusive realizando uma fiscalização com o MPERJ há menos de um ano; (iii)(iii) já foi punido pelo STJD com a determinação de jogar com os estádios vazios pelo período de 30 dias, o que afastaria o apontado periculum in mora; (iv)e (iv) o relatório que embasaria a decisão agravada teria sido elaborado pelo coordenador do CEJESP, o qual seria juiz de direito que não deteria atribuição para tal ato.

Requer a concessão de efeito suspensivo ao recurso e, no mérito, o seu provimento para que seja permitida a realização de jogos no estádio São Januário.

Decisão proferida em sede de plantão judiciário às fls. 145/150, em que indeferido o pedido de concessão de efeito suspensivo ao recurso.

Agravo Interno interposto pelo Clube de Regatas Vasco da Gama às fls. 175/192, no qual reprisa os argumentos lançados no bojo de seu agravo de instrumento quanto à necessidade de concessão de efeito suspensivo.

Decisão monocrática proferida às fls. 196/198, em que o Desembargador José Roberto Portugal Compasso, para o qual foi inicialmente distribuído o recurso, concedeu parcialmente o efeito suspensivo requerido e determinou que a interdição prevista na decisão agravada se limite à proibição da presença de torcedores/consumidores no estádio de São Januário, e julgou prejudicado o Agravo Interno anteriormente manejado.

Contrarrazões ao agravo de instrumento às fls. 210/225, em que o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro pugna pela manutenção da decisão agravada. Decisão de declínio de competência às fls. 245/246, na qual determinou-se o envio dos autos à 1ª Vice-Presidência desse Eg. Tribunal de Justiça para que fosse redistribuído a uma das Câmaras de Direito Privado.

Ratificação da decisão de fls. 196/198, nos termos do disposto no art. 64, §4º do CPC.

O recurso é tempestivo e estão satisfeitos os demais pressupostos de admissibilidade, pelo que deve ser conhecido. A antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional foi consolidada em nosso ordenamento jurídico, a partir do advento da Lei nº 8.952/94 em resposta aos anseios dos doutrinadores e da jurisprudência pátria, como uma das formas de celeridade e garantia da efetividade da prestação jurisdicional.

O artigo 273 do Código de Processo Civil/73, de maneira prudente, estabeleceu os pressupostos para a sua concessão. Exige a prova inequívoca, que a mais abalizada doutrina tem conceituado in verbis:

“aquela que apresenta um grau de convencimento tal que, a seu respeito, não possa ser oposta qualquer dúvida razoável, ou, em outros termos, cuja autenticidade ou veracidade seja provável” (J. E. Carreira Alvim, “CPC Reformado”, ed. Del Rey, 2ª ed., pág. 115).

Em que pesem as alterações realizadas pelo NCPC sobre a matéria, com inovações de procedimento e a previsão da tutela de evidência, os requisitos de concessão da tutela antecipada de urgência permanecem íntegros, conforme art. 300:

“A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.”

Logo, a referida prova deve levar o julgador ao convencimento da verossimilhança da alegação.

Ademais, é imprescindível que haja receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Finalmente, estabelece o § 3º, da referida norma que a medida não poderá ser concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos do provimento antecipatório.

Dessa forma, constata-se que a análise do pedido de tutela antecipada exige redobrada atenção, pois sua concessão implica na antecipação da prestação jurisdicional reclamada. Outrossim, se o magistrado não possui condições de constatar a verossimilhança do direito, melhor que se aguarde um outro momento processual, após uma fase cognitiva mais ampla.

O Enunciado nº 08 do I Encontro de Desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro normatizou a questão de outorga ou denegação da antecipação dos efeitos da tutela de mérito, nos seguintes termos:

“Somente se reforma a decisão concessiva ou não da antecipação de tutela, se teratológica, contrária à lei ou à prova dos autos.”

Nesse sentido, depreende-se que as decisões relativas à antecipação de tutela, subordinam-se ao juízo de aferição do magistrado que preside a instrução e o processamento da causa, só cabendo a reforma em segundo grau se teratológicas, contrárias à lei ou à prova dos autos. Insta ressaltar, que o enunciado foi convertido na atual súmula 59, do TJRJ, que norteia as decisões proferidas em sede de agravo de instrumento, estando a outorga da antecipação de tutela em grau recursal adstrita às hipótesesprevistas na referida súmula.

É bem verdade que o referido verbete sumular foi editado sob a égide do CPC/73, mas, como os requisitos de concessão da tutela antecipada de urgência do NCPC são os mesmos do CPC/73, o enunciado continua válido e aplicável para as decisões de antecipação dos efeitos da tutela de urgência proferidas com base no NCPC.

No caso em apreço, a decisão agravada merece parcial reforma.

Conforme adiantado na fundamentação da decisão em que ratificada a parcial concessão de efeito suspensivo pleiteado ao agravo de instrumento, o r. decisum agravado encontra-se apoiado em fortes elementos de convicção, que resultam dos graves atos de vandalismo praticados no dia 22 de junho de 2023, por “torcedores” presentes no estádio de São Januário.

Consoante as provas colacionadas pelo Ministério Público junto à petição inicial da Ação Civil Pública manejada perante o juízo de origem, em especial, as matérias jornalísticas e vídeos dos confrontos e confusões ocorridos dentro e fora do estádio de São Januário – por ocasião da realização dos últimos jogos, os quais, naturalmente, colocam em patente risco de vida, e integridade física, torcedores/consumidores, moradores das localidades no entorno do estádio e passantes em geral, não há como se entender, ao menos neste momento processual, que o clube agravante tem cumprido adequadamente com sua obrigação legal de fornecer a segurança necessária e adequada aos eventos naquele estabelecimento promovidos.

À exemplo disso, tem-se a constatação de que “torcedores” mal intencionados lograram ingressar no estádio, no dia 22.06.2023, com bombas, rojões e sinalizadores, vindo a atirá-los no gramado do campo de futebol, ao final da partida esportiva que ocorria naquele momento.

No ponto, válido que se ressalte que a segurança do evento (e, consequentemente, dos consumidores que a ele comparecem) é um princípio fundamental do esporte e um direito do espectador, consoante o disposto no artigo 2º, XVI e no art. 146, ambos da Lei nº 14.597/2023.

Senão, vejamos:

“Art. 2º São princípios fundamentais do esporte:

[…] XVI – segurança.”

“Art. 146. O espectador tem direito a segurança nos locais onde são realizados os eventos esportivos antes, durante e após a realização das provas ou partidas.

Parágrafo único. Deve ser assegurada acessibilidade ao espectador com deficiência ou com mobilidade reduzida.”

Outrossim, como bem destacado na decisão agravada, a responsabilidade pela segurança do consumidor, antes e depois de realizada a partida futebolística, ou seja, do seu ingresso à sua saída do evento, conforme disposto no art. 149 da supracitada Lei Geral do Esporte, é da organização esportiva diretamente responsável pela realização do espetáculo e de seus dirigentes, ou seja, do clube mandante da partida.

Ora, vemos nas imagens apresentadas que o cenário calamitoso de intenso tumulto e baderna, recorrentemente, não se restringe ao interior do mencionado estádio, sempre se estendendo aos seus arredores, o que implica na exposição a risco de pessoas que sequer tinham ingressado anteriormente no estabelecimento esportivo.

E, tal conjuntura se revela ainda mais evidente quando rememoramos o ocorrido no último dia 05 de junho, quando, após uma derrota do Vasco da Gama para o time do Flamengo, no estádio do Maracanã, um grupo de ditos “torcedores” se dirigiu à São Januário e lá promoveu mais atos de vandalismo e desordem1, expondo a desnecessário risco um número considerável de pessoas.

Logo, a conclusão a que se chega, ao menos enquanto não realizada a perícia técnica determinada pelo juízo originário, é que as medidas de segurança implementadas pelo clube agravante não tem logrado o mínimo êxito em evitar o acontecimento de cenas de confusão generalizada e depredação de patrimônios, dentro e fora do estádio de São Januário, por parte daqueles que frequentam o estabelecimento esportivo e se intitulam como “torcedores”.

Entretanto, certo é que o r. decisum agravado teve seus limites adequados na decisão proferida pelo Exmo. Desembargador José Roberto Portugal Compasso, mantendo-se a interdição total de acesso do público nos eventos esportivos, mas liberando-se a estrutura para a realização de jogos do Clube agravante – com portões fechados.

E, das partidas já realizadas desde então no estádio de São Januário (sem qualquer acesso do público) extrai-se que não houve o registro de nenhuma ocorrência negativa, dentro ou fora do complexo esportivo, o que confirma a correção da medida implementada.

Cite-se, por exemplo, o jogo realizado em 23.07.2023, envolvendo as agremiações do Vasco da Gama e do Athletico-PR, o qual transcorreu de portões fechados e sem qualquer incidente, inclusive no ambiente externo.

Portanto, o bom senso recomenda, enquanto não apurado que tenham sido devidamente observadas todas as condições de segurança do estádio, que o Clube agravante possa continuar realizando suas partidas no estádio – sempre com portões fechados para acesso do público em geral – até que seja finalizada a perícia técnica determinada pelo juízo originário.

Destaque-se, mais uma vez, que se coloca como imperiosa medida de garantia da segurança pública a interdição do estádio para a realização de partidas futebolísticas e outros eventos relacionados a futebol no local, com qualquer acesso de público, enquanto não restar provado nos autos que o clube responsável pela realização desses eventos esportivos implementou medidas de segurança eficazes para prevenção e contenção de tumultos e badernas, ou seja, que reúne as condições necessárias a garantir a integridade dos espectadores presenciais do evento, bem como dos transeuntes e moradores do entorno do aludido estádio.

Outrossim, quanto aos argumentos ventilados no sentido de lograr a liberação de acesso ao estádio por mulheres, crianças e pessoas portadoras de deficiência, formulados no requerimento de fls. 296/302 e fls. 332/333, deve ser ratificada a decisão de fls. 337/347, pois tais alegações não são aptas a desmerecer a conclusão adotada na decisão em que concedido o efeito parcial ao recurso, às fls. 196/198, e nem àquela em que ratificada essa decisão, nos termos do que dispõe o art. 64, §4º do CPC (fls. 258/270).

À uma, porque basta um simples compulsar dos fólios originários desse agravo de instrumento para que se observe que as alegações então formuladas não foram previamente levadas ao conhecimento do juízo de origem,de forma que sua apreciação diretamente nessa instância revisora configuraria indevida supressão de instância.

À duas, porque, ainda que assim não fosse, destaca-se que o parecer técnico apresentado é prova unilateralmente produzida, que não restou submetida ao crivo do contraditório e, portanto, se revela imprestável ao

desiderato de obter-se a concessão de efeito suspensivo nos moldes do pedido alternativo realizado intempestivamente, diga-se.

À três, porque, no que concerne à decisão proferida por auditor do STJD, no sentido de liberar parcialmente o acesso de público ao estádio, cuida-se aqui de processo distinto, desvinculado de questões ligadas à prática desportiva em si. Tanto o é que, enquanto o julgamento proferido no âmbito do STJD teve por base a apontada infração do art. 213, I e III do CBJD, a Ação Civil Pública manejada pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, da qual se origina esse agravo de instrumento, teve por fundamento a necessidade de comprovação de condições mínimas de segurança para que o alhures referido estádio possa sediar os espetáculos desportivos, e a ocorrência de danos morais coletivos, supostamente passíveis da devida indenização.

Aqui, o que está em jogo, portanto, é a defesa dos direitos transindividuais de consumidores de evento esportivo e, notadamente, a sua segurança, matéria cuja competência para apreciação e julgamento é, como já consignado em provimentos anteriores, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.

Por fim, no que concerne à petição de fls. 360/369, acompanhada da documentação de fls. 370/671, certo é que a eventual demonstração de cumprimento parcial da decisão agravada deve ser apreciada pelo juízo a quo,pois sua pretendida análise diretamente por essa instância revisora configuraria indevida supressão de instância, com a qual não se pode coadunar.

Ademais, ainda que tal constatação não bastasse, fato é que a perícia técnica determinada pelo juízo de origem na decisão agravada ainda não foi realizada, tendo a expert nomeada apresentado seus honorários em 22.08.2023, uma vez que, somente em 31.07.2023, o aqui agravante cumpriu com o comando judicial e apresentou os quesitos a serem respondidos/esclarecidos pela profissional designada.

Assim, observa-se que a justificada demora na confecção do laudo pericial decorre inexoravelmente do atuar do ora recorrente na 1ª instância, porquanto, conforme se colhe da simples leitura do decisum objurgado, o prazo determinado pelo juízo para sua entrega somente seria deflagrado com a apresentação dos quesitos pelos litigantes, o que, como visto, ocorrera há menos de 30 dias.

Não por outra razão, o fechamento do estádio do Maracanã pelo período de 20 dias não pode servir como suporte à tentativa de liberação total do Estádio de São Januário para o recebimento de grande público sem que a perícia técnica, a ser oportunamente realizada sob o crivo do contraditório, confirme ser tal pretensão possível.

Ademais, em que pese afirme que, além da receita não auferida pela interrupção da venda de ingressos, estaria, também, percebendo perdas financeiras em consequência do cancelamento de planos por “sócios torcedores”, destaca-se que nenhuma prova o clube agravante colaciona nesse sentido.

E, mais especificamente sobre o vindicado atuar diligente do recorrente no sentido de maximizar a segurança no estádio, assim, consequentemente, vindo a, alegadamente, cumprir de forma parcial o determinado pela decisão vergastada, há de ser considerado que, conforme provas colacionadas nos autos de origem, embora inúmeras tenham sido as tratativas para formalização de um necessário aditivo ao TAC de 2011, entre compromissários/intervenientes e o Ministério Público, ora recorrido, o acordonão se perfectibilizou, fato consequente do desinteresse do clube agravante em assim proceder, com vistas à implementação das medidas naquele documento previstas.

À CONTA DE TAIS FUNDAMENTOS, conheço e dou parcial provimento ao recurso para limitar a decisão agravada à proibição de acesso de torcedores/consumidores aos eventos realizados no Estádio de São Januário, enquanto não restar comprovada a presença das necessárias condições de segurança, com a apresentação dos laudos técnicos atualizados dos órgãos estatais e realização da perícia técnica determinada pelo juízo a quo.

Vasco busca acordo com o MP

Após o julgamento da semana passada, o Vasco mobilizou políticos locais e fez evento em São Januário pela liberação do estádio O clube ainda tem conversas em andamento com Ministério Público do Rio de Janeiro por um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). Caso isso aconteça, o processo se extingue.

– Nós vamos continuar lutando. O Vasco, a torcida do Vasco e a Barreira do Vasco não podem mais ser prejudicados. Vamos adotar todas medidas possíveis para que o Vasco tenha seus direitos. Não só em relação ao Maracanã, mas como na liberação completa de São Januário – disse Gisele Cabrera, diretora jurídica do Vasco.

Votou junto com a relatora o desembargador Carlos Santos de Oliveira. Sob argumento de que ainda deve haver perícia para a liberação do estádio e que a decisão em liminar deve se manter “enquanto não estiver comprovada a segurança” do local.

A desembargadora Andréa Pacha, voto dissonante no julgamento, defendeu que o estádio fosse liberado para receber público. Alegou que o clube não tem poder de polícia e tomou todas as medidas possíveis. Citou apedrejamento de ônibus do Botafogo na véspera para tratar do estado de violência em dentro e fora dos jogos de futebol.

– Torcida organizada não tem não a ver com a segurança do estádio. Lugar de criminoso é na cadeia – afirmou a desembargadora no voto.

Desembargador alerta contra “torcida” no julgamento

O caso foi julgado na última quinta-feira pela Segunda Câmara de Direito Privado em sessão presencial na sede do tribunal, no Palácio da Justiça, Centro do Rio. São Januário não abre os portões para público há mais de 70 dias, desde o dia 22 de junho, na derrota do Vasco para o Goiás, pela 11ª rodada do Brasileirão.

São Januário seguirá com portões fechados — Foto: André Durão / ge

O desembargador Fernando Foch, que presidia a sessão, iniciou o julgamento com reflexão sobre o que “emociona ou não”, citando números de moradores de rua no Rio de Janeiro e em São Paulo, citou a “escória humana” na “cracolândia” e disse que nada disso “nos emociona, mas o futebol nos emociona”.

Lembrou que havia processo do Vasco e ameaçou prender quem se comportasse “como numa arena” no tribunal.

– Devo dizer que isso não é uma arena, as emoções que fiquem numa arena. Exijo compostura – abriu a sessão o desembargador.

Fonte: GE

admin

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